Em tempos de polarização política, o governo Trump reage ao bloqueio do “X” e o bolsonarismo tenta projetar Eduardo Bolsonaro como grande articulador político.
Renata Medeiros,
Mestre em Ciência Política. Advogada.
Lier Pires Ferreira,
PhD em Direito. Pesquisador do NuBRICS/UFF.
Há alguns dias, o secretário de Estado norte-americano, Marco Rubio, declarou que os EUA estudam impor sanções ao ministro Alexandre de Moraes, o mais polêmico dos membros do STF. Objeto de amor e ódio de muitos brasileiros, “Xandão” seria punido com base no Magnitsky Act, uma lei do governo Obama que permite aos EUA punir autoridades estrangeiras acusadas de corrupção ou violações graves aos direitos humanos. As sanções iriam da proibição de ingresso na América – quiçá para ver o Pateta – até o bloquei de ativos em instituições financeiras dos EUA.
De imediato, setores do bolsonarismo entraram em êxtase, pois a Casa Branca estaria agindo por influência do deputado licenciado, Eduardo Bolsonaro (PL/RJ), hoje radicado nos EUA. Não há dúvida de que Trump e o clã Bolsonaro possuem afinidades políticas e ideológicas. Da mesma forma, é real a conexão entre o filho “03” e Steve Bannon, o polêmico ideólogo do “trumpismo”. Mas será que as ameaças norte-americanas estão realmente ligadas ao prestígio de Eduardo junto ao titular da Casa Branca, para cuja posse, sabemos, não foi convidado?
É muito pouco provável. Trump já deu sinais suficientes de que o Brasil e suas questões domésticas ocupam um lugar marginal em sua agenda política. Vendo o país como parte do imenso “quintal” latino-americano, Trump sequer sancionou significativamente o Brasil ao lançar seus “tarifaços” no mês passado. Com uma balança comercial levemente deficitária em relação à América, o país foi recebeu “brandos” 10%, a menor taxação básica sobre o conjunto dos parceiros comerciais dos EUA. Como comparação, essa sobretaxa, por hora suspensa, foi a mesma imposta ao Reino Unidos, a verdadeira Guiana americana na Europa.
Qual teria sido, então, a motivação da Casa Branca? Ao longo do segundo semestre de 2024, quando a corrida presidencial pegava fogo nos EUA, Moraes pontificou uma verdadeira batalha contra o “X”, antigo Twitter, a “very popular” rede social de propriedade do bilionário sul-africano, Elon Musk, hoje um dos principais assessores de Trump, responsável por seu polêmico programa de desburocratização e redução do Estado americano.
O auge das tensões entre Moraes e Musk ocorreu em setembro de 2024, quando a plataforma chegou a ficar suspensa no Brasil. Somente após cumprir as exigências de Moraes, dentre as quais o pagamento de multas e a indicação de um representante oficial no país, o “X” voltou a operar no Brasil. Como outros brasileiros, Moraes via a rede social de Musk como um mecanismo de desinformação e disseminação de “fake News”.
Essa é a verdadeira motivação da Casa Branca. Todavia, aproveitando o “Fla x Flu” ideológico em vigor, Eduardo Bolsonaro e outros bolsonaristas tentam capitalizar a ameaça trumpista, vendo-a como um sinal inequívoco de que Trump apoia Bolsonaro e que fará de tudo para livrá-lo de uma condenação penal iminente e reconduzi-lo, em triunfo, ao Planalto. Nada mais falso.
Mesmo com a imensa fragilidade política do governo Lula, é muito difícil que Bolsonaro e alguns dos principais nomes do seu governo, como os generais Heleno e Braga Netto, o almirante Garnier e o delegado Ramagem sejam inocentados pelos atos do 08 de janeiro. Da mesma forma, é pouco provável que o ex-presidente consiga se livrar da inelegibilidade, algo que nem setores do seu partido e da própria (extrema) direita brasileira desejam. Ronaldo Caiado e Tarcísio de Freitas, em aliança ou não com Michele Bolsonaro ou outro membro do clã, são nomes mais assertivos para concorrer com um alquebrado Lula, encapsulado entre sua história vencedora, um Congresso hostil e uma primeira-dama que, não raro, atrapalha.
Enfim, o contra-ataque da Casa Branca atende aos interesses de Musk, não aos ardis do “03”, cuja presença nos EUA já começa a ser alvo do sistema de justiça brasileiro. Eduardo Bolsonaro pode não ser o tolo fritador de frangos que seus adversários desenham, mas nem de longe é o articulador político internacional como seus adeptos idealizam. Contudo, no cabo de guerra da política doméstica, as ameaças da Casa Branca soam como música aos ouvidos do bolsonarismo, pouco importando que afrontem à ordem jurídica brasileira e a soberania nacional. Vale tudo para 2026!
“O Império contra-ataca”
27/05/2025
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Gira Mundo
Renata Medeiros — Mestre em ciência política, advogada;
Lier Pires Ferreira — PhD em Direito (UERJ). Pesquisador do NuBRICS/UFF.