sexta-feira, 5 de dezembro de 2025
Bombas e Diplomacia
24/06/2025

O Irã está enfraquecido. Sem apoio militar da Rússia, o país não tem como reagir à aliança Israel-EUA. Embora sua “chuva” de drones e mísseis tenha produzido estragos, perfurando o complexo sistema de defesa popularmente conhecido como Domo de Ferro, é fato que os israelenses dominaram os céus iranianos, abateram autoridades civis e militares e atingiram importantes alvos relacionados ao programa nuclear do país. Além disso, ceifaram cerca de 300 vidas e destruíram expressivas áreas civis, causando pânico entre a população.
Ainda mais pífia foi a resposta iraniana aos ataques norte-americanos com as poderosas bombas “bunker buster” contra suas instalações nucleares. Ao contrário do que propalado pelas autoridades iranianas, a operação “Anunciação da Vitória”, contra a base americana de Al Udeid, no Catar, foi um fracasso. Muitos acreditam, inclusive, que se trata de uma resposta ensaiada, meramente “fake”, usada para ludibriar o público interno e preparar uma “rendição negociada” perante israelenses e norte-americanos. Não por outro motivo, horas depois da “contraofensiva” iraniana, um empoderando Trump anunciou unilateralmente que Israel e Irã chegaram a um cessar-fogo, elogiando os países pela “resiliência, coragem e inteligência para encerrar o que deve ser chamado de ‘a guerra de 12 dias’”. Será que Trump é candidato ao Nobel da Paz? Difícil… afinal, nem Clausewitz, em sua “Arte da Guerra”, supôs um cessar-fogo declarado pelo mandatário de um país não diretamente envolvido no conflito.
A vitória israelense em sua guerra não-anunciada contra o regime dos aiatolás cumpriu vários objetivos: humilhou o Irã, expôs a debilidade militar do país e limitou seu programa nuclear, embora ainda não se possa mensurar os danos causado. Além disso, isolou o país de maioria xiita, que política e militarmente não encontrou aliados em sua “jihad” contra Israel e o “Grande Satã” americano.
A ofensiva israelense é ainda mais contundente quando adicionamos suas recentes vitórias contra o Hezbollah, no Líbano, e contra os huthis, no Iêmen. Na Síria, o regime pró-Irã também foi derrubado e segue a política de terra arrasada em Gaza, onde paramilitares do Hamas e a população civil são abatidos diuturnamente pelas forças de israel. Em verdade, após as falhas de segurança que facilitaram o ataque de 07 de outubro, Israel alterou sua doutrina de segurança e sua política regional, voltando ao “modo ofensivo” que marcou as primeiras décadas de sua existência. Hoje, os israelenses são a força política e militar hegemônica na região. Todavia, nem sempre hegemonia é sinônimo de paz.
Na verdade, a radicalização político-religiosa paira como um espectro sob a “pax” israelense-americana. Na Síria, a coalizão da Hayat Tahrir al-Sham (HTS) desafia o Ocidente. No Iêmen, a guerra-civil persiste e a coalizão governista, pró-EUA, não consegue debelar os huthis. No Líbano, o regime enfrenta inúmeros desafios, inclusive a oposição do Hezbollah. Já na Líbia, a falta de um governo central é agravada pela ação de diversos grupos beligerantes. O cenário é desolador… mesmo em Gaza, apesar do derramamento de sangue, o Hamas não foi erradicado e o conflito árabe-israelense não tem solução no horizonte. Ao contrário! Israel continua sua política de ocupação e as vozes moderadas são frequentemente escanteadas. Enquanto isso, o regime iraniano segue dominante, apesar de enfraquecido, sem que seu programa nuclear tenha sido erradicado. Criado nos anos 1950, esse programa tem revivido a cada novo revés. Será diferente agora?
Por fim, não se pode esquecer que o apoio de Trump à Israel tem ônus internos. Embora tenha maioria no Congresso, a política externa trumpista, seja do ponto de vista comercial, seja no que confronta com o multilateralismo que modula o mundo desde o fim da II Guerra Mundial, tem gerado inflação e o repúdio crescente dos cidadãos americanos, hoje mais interessados em economia que em geopolítica. Mesmo assim, o titular da Casa Branca segue sua política imperialista, cujo alvo último é a China. A forma como ele exerce sua hegemonia busca desmontar a economia chinesa, usando a diplomacia das canhoneiras como instrumento de barganha diante do crescimento da potência asiática.
Já imaginaram o estrago na imagem de Trump se o Estreito de Ormuz fechar, ainda que parcialmente? O preço do petróleo dispara e o combustível aumenta na América. Além disso, o ataque ao Irã – sem autorização do Congresso – é visto por muitos como uma violação à Constituição e aos poderes de guerra do Parlamento. Talvez por isso, Trump tenha precipitado o anúncio do cessar-fogo entre Israel e Irã. Será que o alaranjado está com medo?
Portanto, é curioso notar que, até aqui, a guerra contra o regime dos aiatolás tem efeitos distintos em Israel e nos EUA. Entre os israelenses, a força de Netanyahu cresce a cada árabe morto. Frente aos inimigos externos, sionistas de diversas matizes se unem pela causa de Israel. Mas essa guerra pouco significa para os americanos e para o “staff” trumpista. Não à toa, Trump vocifera sempre que o tal cessar-fogo é violado, ainda que unilateralmente por Israel. Entre bombas e diplomacia, os americanos hoje preferem deportar imigrantes a gastar energias e recursos no Oriente Médio.

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Renata Medeiros — Mestre em ciência política, advogada;
Lier Pires Ferreira
— PhD em Direito (UERJ). Pesquisador do NuBRICS/UFF.