Elon Musk anunciou no fim de semana a criação de um novo partido político nos Estados Unidos, o America Party, com a promessa de romper o duopólio entre democratas e republicanos. A iniciativa, ambiciosa e provocadora, tem todos os elementos de uma típica jogada do bilionário — ousadia, marketing e a promessa de “reinventar o sistema”. Mas, na prática, formar uma terceira via viável no cenário político norte-americano é uma missão quase impossível. E há boas razões para isso.
O The New York Times detalhou de forma didática por que tantas tentativas anteriores fracassaram — e por que Musk pode enfrentar os mesmos obstáculos.
- Regras complicadas, estado por estado
Diferente de sistemas parlamentares com múltiplos partidos consolidados, os EUA têm leis extremamente técnicas e fragmentadas que dificultam a entrada de novos concorrentes no jogo político. Cada estado possui regras próprias sobre acesso às urnas, exigências de assinaturas e prazos. Um candidato independente ao Congresso, por exemplo, precisa reunir cerca de 27 mil assinaturas válidas apenas no estado da Geórgia. Resultado: desde 1943, nenhum nome fora dos dois grandes partidos conseguiu se viabilizar lá.
Até mesmo o nome escolhido por Musk pode enfrentar barreiras legais. No estado de Nova York, por exemplo, é proibido usar a palavra “American” ou qualquer variação nos nomes de partidos políticos.
- Falta de estrutura e liderança confiável
Outro desafio é montar uma estrutura nacional com capilaridade suficiente para competir com democratas e republicanos. Musk teria dificuldade em atrair profissionais experientes sem sofrer retaliações da máquina partidária tradicional — principalmente de Donald Trump, que já puniu consultores que ousaram se aproximar de adversários.
Restaria ao bilionário recorrer a operadores “mercenários”, acostumados ao mundo dos pequenos partidos e campanhas marginais, mas pouco confiáveis para projetos de longo prazo.
- O histórico de fracassos da terceira via
A história americana está repleta de exemplos de partidos independentes que surgiram com força, mas desapareceram rapidamente. O caso mais emblemático é o do Partido da Reforma, criado por H. Ross Perot após sua campanha presidencial em 1992. Perot teve 19 milhões de votos naquela eleição — algo inédito para um outsider —, mas o partido minguou em menos de uma década.
Outras tentativas como Unite America e No Labels também fracassaram. O primeiro parou de lançar candidatos após 2018. O segundo, embora tenha ganhado espaço na imprensa, sequer conseguiu apresentar um nome viável para as eleições de 2024.
A fome por alternativas — e a realidade
É verdade que há apetite por alternativas nos EUA. Pesquisas mostram que boa parte do eleitorado está insatisfeita com o atual sistema político. No entanto, transformar essa insatisfação em votos, estrutura e presença nas urnas é uma barreira que Musk, com toda sua influência e fortuna, ainda não tem garantias de superar.
O anúncio do America Party pode incendiar o debate e pressionar as engrenagens do sistema bipartidário. Mas, como mostra a experiência histórica, romper essa estrutura é algo que nenhum bilionário — nem mesmo Elon Musk — conseguiu fazer até hoje.