1. O que ninguém viu
A reunião entre Lula e Donald Trump, realizada neste domingo (26) na Malásia, já virou manchete em todo o mundo. O que poucos sabem é o que se passou depois que as câmeras foram desligadas. Conversas pessoais, troca de confidências, mal-estar com a imprensa e um clima surpreendentemente amistoso entre dois líderes que, até poucos meses atrás, representavam polos ideológicos opostos.
Fontes do governo brasileiro descrevem um encontro “cheio de nuances”, em que o protocolo diplomático deu lugar a momentos de improviso e curiosidade mútua.
2. O clima: leveza com desconfiança
Trump chegou sorridente, fez comentários sobre a trajetória política de Lula e se mostrou particularmente interessado nos processos da Lava Jato. Perguntou quanto tempo ele ficou preso e chamou o petista de “perseguido político”. A expressão, repetida mais de uma vez, caiu como música aos ouvidos do Planalto.
Mauro Vieira, chanceler brasileiro, descreveu o encontro como “descontraído e até alegre”. Mas, nos bastidores, auxiliares de Lula viram ali um sinal de cálculo: Trump queria marcar distância do bolsonarismo sem rompê-lo completamente.
3. A pasta vermelha e o gesto calculado
Um dos momentos mais simbólicos foi a entrega de uma pasta vermelha com o brasão da Presidência da República. Dentro, argumentos sobre o tarifaço, sugestões de cooperação econômica e até uma proposta de mediação na crise da Venezuela.
Trump ouviu, elogiou a postura de “homem de negociação” e, ao final, ordenou que seus secretários se reunissem com a equipe brasileira ainda naquela noite — gesto visto como sinal prático de avanço.
4. A guerra dos microfones
Antes da conversa privada, houve uma disputa tensa pelo acesso da imprensa. O Serviço Secreto americano queria limitar os jornalistas brasileiros, mas o Planalto exigiu reciprocidade. Lula se irritou com a demora e mandou encerrar a parte pública. Trump, em tom debochado, comentou que as perguntas estavam “entediantes”.
A foto oficial, com poltronas azuis, mesa de flores e sorrisos ensaiados, foi cuidadosamente pensada para dar ao governo brasileiro o troféu simbólico: a imagem do reencontro civilizado com a maior potência do planeta.
5. Bolsonaro foi o fantasma da sala
Mesmo sem estar presente, Jair Bolsonaro foi um dos personagens mais citados do encontro.
Em público, Trump declarou que “sempre gostou” do ex-presidente e lamentou sua condenação por golpe de Estado. Mas em privado, segundo fontes, Lula mencionou o caso para reafirmar que o julgamento foi técnico e independente. Também explicou a insatisfação brasileira com as sanções da Lei Magnitsky contra autoridades nacionais — e ouviu de Trump a promessa de “revisar o assunto”.
6. O que está em jogo
Mais do que tarifas e protocolos, o encontro serviu para redesenhar o tabuleiro político internacional em torno do Brasil.
Trump acenou com pragmatismo: pode revisar as tarifas e abrir espaço para novos acordos, desde que veja no Brasil um parceiro confiável. Lula, por sua vez, quer reposicionar o país como ator de equilíbrio — capaz de dialogar tanto com Washington quanto com Pequim, Moscou e Caracas.
7. A vitória diplomática de Lula
No Planalto, o saldo é de vitória.
O presidente conseguiu sair da defensiva, romper o cerco de hostilidade americana e ainda colher uma cena de simbolismo político.
A imagem de Lula apertando a mão de Trump, logo após o americano elogiar sua trajetória e relativizar Bolsonaro, valeu mais que qualquer nota oficial.
8. E o bolsonarismo?
A ala bolsonarista reagiu com ironias nas redes sociais.
Eduardo Bolsonaro publicou um vídeo com Trump dizendo que “sempre gostou” do pai, insinuando que o assunto incomodou Lula. Mas, nos bastidores de Brasília, o sentimento é outro: o encontro selou o isolamento internacional do bolsonarismo, que apostava numa escalada de tensão entre Brasil e EUA — e colheu o oposto.
Trump pode até manter gestos de cortesia com Bolsonaro, mas deixou claro que quem está com a caneta é Lula.
9. O que vem pela frente
O Itamaraty acredita que a trégua tarifária pode ser anunciada oficialmente nos próximos dias.
Trump deve visitar o Brasil ainda neste semestre, e Lula prepara retorno aos EUA para consolidar o novo eixo de diálogo.
A reunião de Kuala Lumpur entrou para a história não pela pauta econômica, mas pela reviravolta política: Lula e Trump descobriram que têm mais em comum do que os próprios aliados gostariam de admitir.