O portal UOL revelou, em reportagem assinada por Mariana Sanches, correspondente em Washington, os bastidores da improvável reaproximação entre Brasil e Estados Unidos, conduzida por uma figura até então fora do radar diplomático: Richard Grenell, ex-embaixador e aliado de Donald Trump.
Grenell, que ganhou projeção durante o governo republicano, foi um dos operadores mais ativos da ala “America First” — o movimento que defende uma política externa focada exclusivamente nos interesses norte-americanos. Em 2024, atuava como enviado especial de Trump para “missões diplomáticas”, um posto híbrido criado pelo próprio ex-presidente.
Com trânsito entre conservadores latino-americanos e líderes autoritários, Grenell havia negociado libertações de prisioneiros na Venezuela e participado de acordos entre Israel e Hamas. Sua imagem era a de um pragmático, disposto a dialogar com qualquer um que pudesse gerar ganhos estratégicos para os EUA.
As conversas secretas
Segundo o UOL, Grenell entrou em cena quando as relações entre Lula e Trump estavam congeladas. Sem jamais ter pisado no Brasil ou falar português, ele comandou uma série de reuniões secretas e chamadas telefônicas com autoridades brasileiras.
Foram pelo menos três conversas confirmadas — todas antes do abraço entre Lula e Trump na sede da ONU, em setembro. A iniciativa, surpreendente para ambos os governos, teria sido articulada em parte por Grenell, que viajava entre Washington, Nova York e reuniões discretas com o chanceler Mauro Vieira e o assessor Celso Amorim.
A primeira reunião, conforme o relato, ocorreu longe da imprensa, na residência do embaixador brasileiro em Nova York. Foi ali que Trump e Lula, por intermédio de Grenell, ensaiaram o gesto simbólico de aproximação exibido publicamente dias depois.
O desconforto dos republicanos
A atuação de Grenell foi tão reservada que nem mesmo o senador Marco Rubio, republicano influente e rival de Trump, soube dos contatos. Rubio, que historicamente defende linha dura contra o Brasil e a América Latina, ficou surpreso com o tom conciliador do ex-presidente americano.
Enquanto isso, Trump reduzia o tom de hostilidade e sinalizava disposição para aliviar sanções econômicas impostas durante o governo Biden. O movimento também atendia a interesses práticos: as exportações agrícolas e energéticas entre os dois países haviam despencado.
O gesto provocou desconforto em setores trumpistas mais radicais, mas consolidou Grenell como o homem de confiança de Trump para a América Latina — um mediador capaz de transitar entre chavistas, bolsonaristas e lulistas sem levantar suspeitas.
Da tensão à “química”
O clímax da narrativa veio com o abraço entre Lula e Trump na ONU. O gesto, classificado por Grenell como “a foto que virou símbolo de uma nova era diplomática”, marcou a superação de uma década de rusgas.
Na véspera, o senador Rubio havia prometido que os EUA “responderiam adequadamente” ao que chamou de “caça às bruxas” contra Jair Bolsonaro — mas, no dia seguinte, assistiu surpreso ao aperto de mãos e ao sorriso entre os dois presidentes.
A “química”, como descreveu a jornalista, se consolidou quando ambos perceberam o potencial econômico e político da reaproximação. Trump, de olho em 2028, busca recompor pontes na América Latina; Lula, pragmático, viu na trégua uma chance de proteger o agronegócio e aliviar tensões comerciais.
Bastidores que mudam o tabuleiro
A história mostra como a diplomacia paralela de Grenell, longe dos canais formais do Departamento de Estado, ajudou a reverter a pior crise entre Brasil e EUA desde os tempos de Dilma Rousseff e Barack Obama.
Mais do que um gesto simbólico, foi um movimento estratégico que recoloca os dois países em diálogo direto — e reposiciona Richard Grenell como o homem que fez a ponte impossível entre Lula e Trump.