terça-feira, 1 de abril de 2025
Ucrânia derrotada!
17/02/2025
  • Por Lier Pires Ferreira e Renata Medeiros

Fronteiras podem unir ou separar, como mostra a Ucrânia. Com o retorno de Trump à Casa Branca, o apoio norte-americano à resistência ucraniana declinou. Em seu novo mandato, Trump reconstrói as pontes entre Washington e Moscou, onde Vladimir Putin celebra cada novo movimento do líder americano pelo fim da guerra, que completará três anos no dia 24/02.

Putin tem seus motivos. Para além dos laços históricos entre russos e ucranianos, povos eslavos originários de Kiev, o país é uma das grandes áreas férteis da Europa Oriental. O “celeiro da Europa” também pode funcionar como uma zona de segurança para o território russo, se estiver aliado a Moscou. Mas, se controlada pelas potências europeias, pode vir a ser um trampolim contra a Rússia. Por isso, o Kremlin jamais admitiu que a Ucrânia ingressasse na OTAN, instalando, na fronteira entre os dois países, armas de destruição em massa. Além disso, vaidoso, Putin deseja deixar um legado de força e grandeza na história russa, ombreando-se aos grandes líderes do passado. Após reorganizar as forças políticas internas, subjugar adversários e resgatar o poder militar do país, o ex-agente da KGB não permitirá que a Ucrânia se torne uma plataforma anti-Rússia.

Mas Trump não é ingênuo. Ele está ciente que os esforços pró-Ucrânia realizados pelo governo Biden endividaram o país, cuja economia tende ao colapso. Os conflitos sistemáticos em seu território detonaram a infraestrutura ucraniana, mutilaram suas cadeias produtivas e ceifaram vidas preciosas. Além disso, o moral das tropas está baixo, as deserções aumentaram e o país está endividado. Carente de fundos, terá que ceder seus maiores tesouros pela chance de sobreviver. É aí que Trump entra. Ganancioso, ele deseja controlar as jazidas de terras-raras existentes na Ucrânia, com ou sem a concordância dos ucranianos. Outrora fartamente exportadas pela China, que detém as maiores reservas mundiais, essas substâncias, de difícil extração e alto valor industrial, escasseiam no mercado internacional, fazendo com que as jazidas ucranianas, assim como as de Brasil, Índia e Vietnã, valham ainda mais.

Outro objetivo de Trump é vender armas para a Europa. Não para a Ucrânia, exatamente, mas para seus aliados da OTAN, inclusive para os países do Mar Báltico, os Nórdicos e a Polônia, todos eriçados contra um improvável expansionismo russo. Ainda que ao custo de rearmar a Alemanha, o complexo industrial-militar americano, liderado por empresas como Lockheed Martin, Boeing e Northrop, deseja ampliar suas vendas, acompanhado por suas co-irmãs européias, como a britânica BAE Systems, a alemã Rheinmetall e a Italiana Finmeccanica. Daí a pressão para que os países da OTAN aumentem seus orçamentos de defesa, ou seja, seus gastos militares. Afinal, matar custa caro, embora seja um excelente negócio.

Estados Unidos e Rússia se reúnem nesta terça-feira, 18/02, para debater os rumos da guerra. Líderes europeus, inclusive ucranianos, não foram convidados para esse encontro em Riad, na Arábia Saudita. A ideia é esboçar o futuro acordo de paz, dividindo entre as duas superpotências a fina-flor dos espólios ucranianos. Por isso, alemães, franceses e britânicos estão ressentidos. Tratados como aliados de segunda-categoria, eles terão que se contentar com a rebarba russo-americana.

Embora não se possa afirmar que Trump e Putin conseguirão costurar um acordo de paz em tão pouco tempo, nem que irão convencer as potências da OTAN e os próprios ucranianos de que as hostilidades devem cessar imediatamente, o fim da guerra é iminente. Sem os Estados Unidos, a Europa não é capaz de sustentar a contenda e terminará por ceder diante do ímpeto unilateralista do agora todo-poderoso Trump.

No final das contas, os russos ficarão com territórios ucranianos já ocupados, inclusive a Crimeia, além de manterem sob segurança as usinas nucleares e os gasodutos que permitem com que seus vastos depósitos de gás abasteçam a Europa. Já os americanos terão o controle das jazidas de terras-raras e a primazia da reconstrução do país, ao passo que as potências da OTAN serão compensadas com nacos do controle americano sobre a “pátria-mãe” dos eslavos. A Ucrânia está derrotada! Zelensky, o presidente-comediante, poderá entrar para história como bufão ou como o grande líder da resistência. Pouco importa. O certo é que os ucranianos, que já pagaram os ônus da guerra com a vida dos seus filhos, agora terão que suportar a perda de novos territórios, além de arcar com a dependência político-econômica ante potências estrangeiras.

* Lier Pires Ferreira — Doutor em direito pela Universidade Federal Fluminense, advogado; * Renata Medeiros — Mestre em ciência política, advogada

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Lier Pires Ferreira — PhD em Direito (UERJ). Pesquisador do NuBRICS/UFF;
Renata Medeiros — Mestre em ciência política, advogada.