sexta-feira, 5 de dezembro de 2025
Risco de Parkinson e manifestação dos sintomas pode estar associado a mudanças climáticas
25/11/2025

Estudos começam a detectar evidências entre o aquecimento global e a intensificação dos quadros de doença neurodegenerativa

As mudanças climáticas começam a entrar no radar da ciência como possíveis influências tanto na incidência quanto na modulação dos sintomas do Parkinson. Pesquisas recentes vêm sugerindo que a saúde do cérebro, meio ambiente e a necessidade de políticas de adaptação climática podem estar mais conectados do que se imaginava.

Fenômenos climáticos complexos, causados principalmente pela concentração excessiva de gases de efeito estufa (GEE) na atmosfera terrestre, como ondas de calor, eventos climáticos extremos, insegurança alimentar e hídrica e piora da qualidade do ar estão entre os fatores ambientais reconhecidos pela Organização Mundial da Saúde (OMS)¹ que a aumentam o risco de doenças não transmissíveis. Esses efeitos podem desencadear ou agravar condições de saúde, especialmente entre populações vulneráveis, e, somados ao estresse emocional, também podem contribuir para o surgimento ou agravamento de doenças que afetam o cérebro e a saúde mental.

Para o Dr. Marcelo Valadares, neurocirurgião funcional, pesquisador da Disciplina de Neurocirurgia da Unicamp e especialista no tratamento da doença de Parkinson, o momento é de vigilância ativa. “Embora as evidências sobre mudança climática e Parkinson sejam emergentes e heterogêneas entre países, faixas etárias e métodos, temos que nos antecipar. É prudente considerar o clima como um elemento que pode influenciar a doença e orientar pacientes, famílias e profissionais de saúde a adotarem cuidados específicos, ao passo em que a ciência avança. Não é alarmismo, mas adaptação a um mundo que está mudando rapidamente”, pondera o especialista. 


Incidência versus risco ambiental

Nos últimos anos, estudos começaram a investigar uma possível relação entre aumento de temperatura e incidência de Parkinson. Um deles, publicado no Journal of Climate Change and Health², analisou dados de 185 países entre 1990 e 2016, avaliando a variação da temperatura média global e indicadores de Parkinson (prevalência, mortalidade e anos vividos com incapacidade), e identificou uma tendência: os locais que mais aqueceram foram também os que registraram maior crescimento nos índices ligados à condição, com efeito ainda mais acentuado em países que já apresentavam temperaturas médias mais elevadas.

Outro estudo, publicado no periódico científico Parkinson’s Disease³ neste ano, apontou que, no subgrupo de indivíduos com menos de 50 anos, a poluição atmosférica – especialmente a exposição prolongada ao material particulado fino (PM₂.₅) – esteve associada ao maior risco de desenvolvimento de Parkinson. O achado sugere uma possível vulnerabilidade etária, que ainda precisa ser confirmada em novas pesquisas.

Os achados reforçam a necessidade de ampliar o olhar sobre os fatores que contribuem para a etiologia dessa condição degenerativa. Um artigo de revisão publicado em 2025 na revista Movement Disorders⁴ destaca que a compreensão do Parkinson deve incluir, além de genética e envelhecimento, a influência de exposições ambientais, como pesticidas, poluentes industriais, poluição urbana e substâncias tóxicas. Como muitos desses fatores tendem a se intensificar com a crise climática, os autores defendem a urgência de políticas voltadas à redução de exposição ambiental e maior integração entre neurologia, saúde pública e proteção ambiental, em convergência com as recomendações recentes da OMS. 


Modulação de sintomas e efeitos clínicos relacionados ao clima

Ainda não há conclusões definitivas, mas os pesquisadores apontam uma tendência preocupante em um cenário de aquecimento global acelerado que pode interferir na manifestação dos sintomas e no bem-estar e qualidade de vida de indivíduos com Parkinson. 

American Parkinson Disease Association (APDA)⁵ destaca que mudanças de temperatura, umidade e pressão atmosférica podem agravar sintomas motores e não motores, e recomenda que o clima seja considerado na rotina de cuidados. “Por isso, é essencial que pacientes e famílias adotem uma postura preventiva: ajustar rotinas em dias extremos de calor ou frio, reforçar hidratação, observar mudanças nos sintomas e buscar orientação médica sempre que necessário”, alerta o Dr. Valadares.

Altas temperaturas e ondas de calor cada vez mais frequentes podem intensificar fadiga, confusão, hipotensão ortostática, desidratação e alucinações, além de dificultar o controle da temperatura corporal devido a alterações no sistema nervoso autônomo causadas pela doença. Já o frio intenso tende a acentuar rigidez muscular, dor e tremores, tornando movimentos simples mais difíceis. Ambientes muito úmidos podem causar inchaço nas extremidades e sensação de lentidão, enquanto altitudes elevadas podem agravar tontura, desequilíbrio e instabilidade postural, reduzindo a segurança na locomoção. 

À medida que eventos climáticos se tornam mais intensos e frequentes, cresce a necessidade de serviços de saúde e gestores públicos antecipar a incorporação de variáveis ambientais no planejamento do cuidado e na proteção de grupos vulneráveis”, avalia o neurocirurgião.

O Brasil já dispõe de materiais oficiais que reconhecem os impactos das mudanças climáticas sobre a saúde, como o Guia de Mudanças Climáticas para Profissionais da Saúde⁶, publicado pelo Ministério da Saúde. No entanto, o documento não orienta no planejamento e na prevenção de doenças crônicas não transmissíveis, como é o caso do Parkinson.

canal whatsapp banner

Compartilhe: