sexta-feira, 5 de dezembro de 2025
Os novos salões da falsidade
11/10/2025

Mudaram as roupas, as taças e os discursos, mas a essência continua a mesma. Os salões burgueses de hoje — sejam eles físicos, em coberturas iluminadas, ou virtuais, nas redes sociais — repetem, com zelo quase religioso, a encenação dos antigos salões aristocráticos.
Nos dois, o que se busca não é a verdade, e sim o reflexo mais conveniente da aparência.

A herança do brilho oco

Nos tempos da aristocracia, os salões eram vitrines de distinção: lugares onde o poder se exibia em gestos medidos, risos contidos e palavras escolhidas para não ferir. A burguesia, ao conquistar espaço, não destruiu o modelo — apenas o reformulou à sua imagem e conta bancária.
O sangue azul foi trocado por cartões black, mas o olhar de superioridade permanece o mesmo, envolto em perfumes caros e sorrisos ensaiados.

Os novos figurinos da superficialidade

Hoje, os salões não têm lustres de cristal, mas luzes de LED e filtros digitais. A etiqueta dá lugar ao algoritmo, e o “charme” é medido em curtidas.
Os eventos, as festas e os coquetéis são apenas versões atualizadas de um teatro social onde se entra para ser visto, não para ver.
O diálogo autêntico virou risco de imagem; o silêncio, uma forma elegante de autopreservação. E cada elogio, na verdade, é um investimento disfarçado de gentileza.

Da aristocracia ao Instagram

Nos velhos salões, o segredo da nobreza era não se misturar. Nos novos, é parecer acessível sem nunca se expor de verdade.
Entre taças e selfies, os convivas dançam a mesma valsa de conveniências. O verniz substitui o valor, e o brilho das telas ofusca o brilho da alma.
A sociedade parece não ter aprendido com os séculos: continua a confundir elegância com disfarce, prestígio com aparência, poder com pose.

A coreografia das vaidades

A falsidade e a superficialidade resistem porque cumprem uma função social: mantêm a engrenagem girando. Quem ousa ser sincero, perde espaço; quem pensa, atrapalha a festa.
O mundo moderno aperfeiçoou a hipocrisia — tornou-a estética, vendável, digital. O que antes era privilégio de uma elite restrita, hoje é acessível a todos com boa conexão e um filtro bem escolhido.
Vivemos o tempo em que o brilho substitui o conteúdo, e o raso se apresenta como profundo.

E assim seguimos, dançando no mesmo salão — agora global, iluminado e superficial — onde cada um ensaia o personagem que mais agrada à plateia.
A diferença é que, hoje, a festa é transmitida ao vivo, e ninguém percebe que o som já acabou.

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