quarta-feira, 2 de abril de 2025
O vínculo trabalhista de atleta em discussão
30/01/2025

  • Por Higor Maffei Bellini

Pois bem, o que eu disse quando escrevi o artigo: “Jogadora de futebol não profissional até pode ser.” Mas, empregada do clube, sempre” não tinha ideia de que voltaria ao mesmo raciocínio, mas mudando o esporte. E hoje volto falando da natação brasileira, que tanto nos traz medalhas e orgulho nas olimpíadas e campeonatos mundiais, que insiste em cometer o mesmo equívoco do futebol feminino, dizer que os atletas são amadores e por isso não anotam o contrato de trabalho do atleta na CTPS.

Hoje, com a entrada em vigor da Lei Geral do Esporte, ficou claro que o atleta passa a ser profissional, não apenas ao receber salário, ponto que muitos clubes usavam para fraudar a contratação, chamando a remuneração paga ao atleta de bolsa auxílio e não de salário, para assim confundir o atleta e o poder judiciário, pois se fosse bolsa auxílio, segundo a Lei Pelé, não caracterizava o profissionalismo.

Agora assim está estabelecido na Lei Geral do Esporte:

Art. 82. A atividade assalariada não é a única forma de caracterização da profissionalização do atleta, do treinador e do árbitro esportivo, sendo possível também definir como profissional quem é remunerado por meio de contratos de natureza cível, vedada a sua participação como sócio ou acionista da organização esportiva.

Que também traz uma definição ampliativa do que é ser profissional, no parágrafo único do seu artigo 72, quando assim estabelece:

Art. 72. A profissão de atleta é reconhecida e regulada por esta Lei, sem prejuízo das disposições não colidentes contidas na legislação vigente, no respectivo contrato de trabalho ou em acordos ou convenções coletivas.

Parágrafo único. Considera-se atleta profissional o praticante de esporte de alto nível que se dedica à atividade esportiva de forma remunerada e permanente e que tem nessa atividade sua principal fonte de renda por meio do trabalho, independentemente da forma como recebe sua remuneração.

Tendo isso em mente, é importante destacar que o nadador, atrelado a um time, por meio de um contrato, mesmo que não chamado de trabalho, é empregado deste time, como vem reconhecendo a justiça do trabalho, pois se o nadador tem de cumprir rotinas de treinamento, tem de ficar recolhido em concentração antes de competições, não podendo deixar o hotel, para passear na cidade, e recebendo salário por tudo isso, é empregado, sim.

E no ramo do direito do trabalho deveria prevalecer o princípio da primazia da realidade, quando, pela aplicação do artigo 9 da CLT, se declara nulo tudo o que for efetuado para fraudar a relação de emprego, focando no que realmente acontecia, no dia a dia no trabalho.

Por isso tudo, é importante destacar a decisão vinda da Justiça do Trabalho Mineira, que reconheceu a existência do vínculo empregatício entre um nadador, de expressão no meio do esporte, e um clube de Belo Horizonte, determinando a anotação do contrato de trabalho na CTPS do atleta.

Ponto importante desta sentença é que ela reconhece que para a formação do vínculo empregatício não se exige a exclusividade, ou seja, o fato do nadador ter defendido o exército brasileiro em competições e torneios não impede o reconhecimento do vínculo, o que é correto, pois se ao policial militar é possível ser militar e ter reconhecido vínculos com outros empregadores, por que não seria possível ao militar do exército, como já se deduziu também no caso das jogadoras de futebol do Flamengo?

Esta não é a primeira sentença neste sentido, mas é importante ser comentada nessa coluna, pois traz esse enfoque da análise da realidade, verificando a obrigação do atleta em face do clube e o mais importante, deixando expressamente consignado que para o atleta também vale a não exigência de exclusividade na prestação de serviços.

Pois isso poderá ser aplicado a tantos outros esportistas, que têm outra atividade além de defender o clube, que se viam prejudicados, quando pediam o reconhecimento do vínculo, pois alguns juízes trabalhistas, pensando que o mundo do esporte no Brasil é da série A do campeonato brasileiro masculino, com atletas recebendo salários de sete dígitos ou em centenas de milhares de reais, entendem que o atleta só pode trabalhar para o clube, pois se tem atividade paralela, não é atleta profissional, não é empregado, é apenas um amador, que faz o esporte para manter a forma física e ainda recebe por isso.

Essa mudança de paradigma é que fez nascer este artigo, que analisa a sentença muito bem redigida pela MM juíza do Trabalho, que foi técnica ao fazer a sua análise, colocando os precedentes, bem como os princípios trabalhistas na aplicação do caso, como deve ser, pois o contrato de trabalho nasce antes do contrato especial do atleta, que deveria ser fonte de maior proteção e direitos, nunca razão para exclusão destes.

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