Uma advogada de Juazeiro (BA) foi condenada a pagar multa de dez salários mínimos por apresentar, em um processo criminal, jurisprudências e dispositivos legais falsos gerados por ferramentas de inteligência artificial. A decisão inédita é do juiz Cláudio Santos Pantoja Sobrinho, titular da Vara do Júri da comarca, e foi divulgada nesta quinta-feira (11).
Segundo o magistrado, a profissional incluiu em sua petição supostos acórdãos com números de processos inexistentes, citações de desembargadores que não integram os quadros dos tribunais mencionados e até a adulteração do texto original do artigo 414 do Código de Processo Penal. A petição também atribuiu indevidamente ao Supremo Tribunal Federal (STF) um posicionamento que jamais foi adotado pela Corte.
“Embora se reconheça a utilidade da inteligência artificial para o aumento da produtividade no meio jurídico, é imprescindível que seu uso seja acompanhado de responsabilidade e supervisão profissional”, afirmou o juiz. Ele classificou a conduta como “manifesto ato atentatório à dignidade da Justiça” e “litigância de má-fé”, violando o princípio da lealdade processual — considerado um dos pilares do sistema jurídico brasileiro.
A decisão determinou ainda a comunicação do caso à Ordem dos Advogados do Brasil – Seção Bahia (OAB/BA), que poderá adotar as medidas disciplinares cabíveis contra a profissional.
Precedente jurídico e alerta à advocacia
O caso marca um precedente importante no país sobre os limites do uso de inteligência artificial na prática da advocacia. A decisão cita outros episódios semelhantes, como um julgamento do Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR), que se recusou a apreciar um recurso baseado em 43 jurisprudências inexistentes, também criadas por IA. Na ocasião, o TJPR alertou: “O Poder Judiciário não está brincando de julgar recursos”.
A punição serve como alerta para toda a classe advocatícia quanto ao uso indiscriminado de tecnologias na elaboração de peças jurídicas. Embora ferramentas de IA possam ser úteis na pesquisa e produção de documentos, a verificação da veracidade das informações continua sendo responsabilidade exclusiva dos advogados, únicos detentores da capacidade postulatória.
O episódio evidencia a necessidade de equilíbrio entre inovação tecnológica e ética profissional, reforçando que a confiança entre os operadores do direito é essencial para o funcionamento da Justiça — e qualquer tentativa de burlar essa confiança será firmemente punida.