“Não fuja da dor” — Titãs

Envelhecer é suportar a dor.
Da infância à maturidade, tudo o que se vive, vive-se para criar resistências físicas e psicológicas a ela.
Não é que faltem ao idoso sentimentos, sensibilidade ou lágrimas. Mas, se essas manifestações emotivas aparecem, é porque o ferimento conseguiu ultrapassar a couraça dos anos.

Entre as árvores, é possível saber-lhes a idade pelas capas que as protegem; nos humanos, pela resposta imediata ou demorada a um ferimento.
Comparado o choro fácil de um bebê à lágrima disfarçada de um adulto, veem-se as diferenças que presidem as fases da vida.

No primeiro caso, há uma espécie de linguagem do choro — um aviso que evolui com o tempo: começa pelo ferimento na cabeça, passa pelo braço quebrado, pela briga de rua, pelo sucesso num concurso, pelo compromisso matrimonial, pela paternidade (ou maternidade) e até pelas primeiras perdas de companhias.

No segundo caso, o choro, quando aparece, é de uma pedagogia exemplar: pede calma e implora união e resignação.
“As lágrimas dos jovens, [da mesma maneira que os rios], são fortes como um segredo.”
Já as lágrimas de mãe, garantem os apóstolos, “são formadoras de diamantes” — daí a construção molecular carbônica da pedra.

Pais não têm lágrimas expostas; conhecem-nas os travesseiros, as mangas de camisa e os dedos polegares. Pais têm sangue.
Esse sangue paterno é que forma o ouro que brilha — também garantem os profetas.
Filhos lacrimejam pelos poros para fertilizar a terra: são “o sal da terra”.

Portanto, não tem fundo verdadeiro a afirmação humorística de que pisar no chão sem sentir dores, depois dos quarenta, é sinal de que se está morto.
É no início da vida que a sensibilidade é epidérmica. O tempo a aprofunda corpo e mente adentro, para só aflorar quando se precisa de uma aula de sentimentos.

A morte, enfim, é um estágio final, quando já não há mais espaço para dor nos recônditos humanos (e animais).
A rigor, não se morre: supera-se a dor.

Que a vida nos seja leve.