Elon Musk não nasceu nos Estados Unidos. O bilionário sul-africano, fundador da Tesla, da SpaceX e dono da plataforma X (antigo Twitter), tornou-se cidadão americano apenas no início dos anos 2000, após uma trajetória migratória que começou em Pretória, uma das capitais oficiais da África do Sul. Esse detalhe — muitas vezes negligenciado — voltou ao debate político nesta terça-feira (1º), quando o ex-presidente Donald Trump insinuou que poderia deportar Musk caso volte ao poder.
“Eu não sei. Acho que vamos precisar olhar. Acho que vamos ter que colocar o DOGE (Departamento de Eficiência Governamental) contra o Elon. Você sabe o que é o DOGE? O DOGE é o monstro que pode voltar e comer o Elon. Isso não seria terrível?”, declarou Trump, em tom irônico, ao ser questionado por uma repórter sobre sua atual relação com o empresário.
Apesar do tom jocoso, a fala lança luz sobre o grau de deterioração da relação entre os dois — e toca num ponto jurídico sensível: embora extremamente raro, cidadãos naturalizados podem, em tese, ter sua cidadania revogada em casos excepcionais, como fraude no processo de naturalização ou ameaça à segurança nacional.
Entre tapas e beijos
A relação entre Donald Trump e Elon Musk, dois dos homens mais poderosos e controversos do planeta, atravessou fases de aproximação estratégica e rompimento público. De início cordial, a convivência foi marcada por afinidades ideológicas pontuais, gestos de apoio indireto e, mais recentemente, críticas contundentes de ambos os lados. A “parceria” que parecia improvável acabou se tornando um dos episódios mais emblemáticos da interseção entre política, tecnologia e poder.
Apesar de se declarar independente, Musk flertou com a pauta conservadora após a saída de Trump da presidência em 2021. Defensor de uma liberdade de expressão sem filtros, o bilionário encontrou eco em discursos contra o “controle” das big techs — bandeira que Trump também empunhava após ser banido das principais redes sociais por incitação à violência. O gesto mais simbólico dessa aproximação veio em 2022, quando Musk, recém-comprador do Twitter, restabeleceu a conta de Trump, até então suspensa desde a invasão do Capitólio.
Mas a reaproximação não durou. Em 2024, com o aquecimento da corrida presidencial, Musk passou a adotar um tom mais crítico ao trumpismo, demonstrando preferência por um perfil mais centrista e pragmático. Chegou a declarar que os EUA precisavam de “menos drama e mais eficiência”. A ruptura ganhou contornos mais agressivos quando Trump passou a atacar Musk diretamente, chamando-o de “artista do bullshit” e insinuando que seus empreendimentos só sobrevivem graças a subsídios estatais.
As divergências são muitas. Na pauta da imigração, por exemplo, Musk — ele próprio imigrante — defende uma abordagem mais flexível, especialmente para profissionais qualificados. Já Trump insiste no endurecimento das fronteiras. Além disso, Musk aparenta rejeitar o estilo combativo e teatral do ex-presidente, que considera contraproducente para o debate nacional.
Muito além da política
O fim desse “relacionamento” reverbera em diversas frentes. Na política, pode influenciar parte do eleitorado jovem e digitalmente engajado que acompanha Musk com atenção. Na tecnologia, escancara o poder das plataformas digitais na arena pública — especialmente o X, sob o comando direto de Musk. E na cultura política dos EUA, torna-se mais um capítulo da polarização crescente e da guerra de narrativas que envolve direita, esquerda e os que preferem não se encaixar em nenhum rótulo.
Se a separação é definitiva, ninguém sabe. Mas como em qualquer relação entre titãs, entre tapas e beijos, tudo pode mudar no próximo tweet.