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Um doido de pedra

Lá em Sant’Ana ele andava com os bolsos da calça cheios de pedras, atirando-as na cabeça dos meninos
  • Por Zé Euflávio

O “Sebastianismo” foi uma crença ou movimento profético que surgiu em Portugal em fins do século XVI como consequência do desaparecimento do rei D. Sebastião na Batalha de Alcácer-Quibir, em 1578, que gerou uma crise de sucessão em Portugal.

A crença encontrou campo fértil no interior do Nordeste do Brasil. Ariano Suassuna explica isso bem direitinho na sua obra A Pedra do Reino.

Zé Marcelino era um doido de Sant’Ana. Andava com os bolsos da calça cheios de pedras, atirando-as na cabeça dos meninos. Mas, só dos meninos virgens, os que nunca tinham tocado numa mulher.

Foi criado na Serra Branca ouvindo a lenda do Carneiro Encantado, habitante das profundezas do amontoado de pedras que forma o acidente geográfico mais intrigante do mundo.

O Carneiro vivia à beira de um poço de águas cristalinas, embaixo de um pé de Imbé, uma planta misteriosa, que produzia um fruto de sabor inigualável. Mas, tinha um segredo para consumir o fruto.

E só podia ser visto duas vezes por ano: no Equinócio da Primavera, em setembro, quando os raios solares incidem sobre a Linha do Equador e penetravam pela fresta na pedra formando uma espécie de laser na direção do Carneiro de Ouro.

A outra vez era em março durante o Solstício. O Cigano Melchiades saiu do Marrocos, cruzou o Estreito de Gibraltar, entrou na Espanha e atravessou toda a Península Ibérica até chegar ao Norte de Portugal, beira do Rio Douro.

Tudo por conta do sonho de uma Tia, uma cigana velha, que lhe jurou sobre a existência do Carneiro e deu-lhe as coordenadas para chegar nele. E lhe entregou um Astrolábio.

Zé criou-se ouvindo essa história. E acreditava que se acertasse uma pedra suja de sangue no Carneiro o encantamento era desfeito e ele se tornava um homem rico com tanto ouro. O Cigano perdeu o juízo pensando nisso.

Em um sábado de feira, Toinho Alvino chamou o homem de doido, apelido que ele não gostava, e uma pedra lhe foi atirada, furando-lhe a cabeça. O doido correu e apanhou a pedra, partindo na direção da Serra Branca. Era o mês de março e naquela tarde o Carneiro podia ser visto.

Nessa tarde caiu uma chuva descomunal, o Sol não apareceu e a fresta por onde o encantamento podia ser visto virou um breu.

Marcelino se lastimou e jurou que voltaria a pegar o Aleijado de Ademar Alvino, como era chamado Toinho.

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Zé Euflávio

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